Voluntariosa, namoradeira, avessa a convenções sociais, gênio, pianista excepcional, compositora de envergadura. Todos esses adjetivos são empregados para descrever Francisca Edwiges Neves Gonzaga e, diga-se de passagem, parecem descrevê-la com exatidão. Nascida em 17 de outubro de 1847, da relação de um homem branco, militar do Exército brasileiro, de família ilustre do Império, com uma mulher mestiça e pobre, filha de escravos, Chiquinha veio ao mundo para quebrar tabus e desafiar o status quo vigente. Casou-se cedo, por exigência da família, mas oprimida pelo marido, que não via com bons olhos a dedicação de Chiquinha ao piano, logo se separou e passou a viver com João Batista de Carvalho, o que resultou em um divórcio rumoroso. Imaginem! Uma mulher divorciada, antes da virada do século passado! Por sua coragem de abandonar um casamento infeliz, Chiquinha foi execrada publicamente, sofreu preconceitos de toda ordem e se viu sozinha, precisando sustentar-se. Foi fazer o que sabia: tocar piano, apresentar-se em bailes, dar aulas particulares. O fato de trabalhar foi o causador de novo escândalo: mulheres não se tornavam profissionais da música. Mulheres nasciam para as prendas domésticas, para costurar, cuidar da casa, ensinar aos filhos bons modos. Era admitido que aprendessem piano, fazia parte da formação de uma boa dama da sociedade brasileira, mas apenas para “consumo interno”, nunca para se exibir em público.
Chiquinha não arrefeceu e foi cuidar da vida. Começou a compor, se dedicou aos alunos e passou a se apresentar no conjunto do flautista Joaquim Callado, um grande amigo e incentivador de sua arte. Callado introduziu Chiquinha no meio dos “chorões”, artistas que tocavam o Choro, adaptação de polcas, valsas e outros ritmos europeus à realidade brasileira. A polca Atraente, retrata em outro post, trouxe-lhe fama. Foram inúmeras composições de sucesso, inclusive para teatro, o que também lhe trouxe dissabores, já que mulheres não tinham permissão de participar desse meio no início do século XX. Entre suas composições encontram-se a marchinha de carnaval “Ô abre alas”, o tango ” Gaúcho”, “a valsa “Plangente”.
Em sua vida livre de convenções, Chiquinha namorou homens muito mais jovens, divorciou-se, foi abolicionista, lutou pela garantia dos direitos autorais, ganhou seu próprio dinheiro e se dedicou a arte, compondo, tocando, regendo orquestras, tudo impensável para mulheres do início do século XX. Ao morrer, nos deixou um legado de valsas, tangos, lundus, maxixes, polcas. Morreu aos 87 anos, em 28 de fevereiro de 1935.
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